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Bruxaria e cristianismo

Atualizado: 13 de nov. de 2020

Que tipo de imagens vem à sua mente quando se fala em bruxaria? Para muitos, esse fenômeno religioso traz pensamentos tenebrosos, como, por exemplo, rituais secretos com intenções macabras, trabalhos de maldição lançados sobre aqueles a quem se deseja o mal, etc.

Outros, por sua vez, só lembram da bruxaria uma vez por ano, e as imagens mais comuns que têm desse fenômeno são as de crianças com chapéus pretos e pontudos, saboreando doces; papéis de decoração recortados em formas de vassouras voadoras; abóboras; morcegos e folhas secas. Esse tipo de coisa cria um problema quanto ao entendimento a respeito daquilo que a bruxaria realmente é. Em geral, as pessoas acham que o assunto ou é muito amedrontador ou é muito tolo para ser considerado. É bastante provável que a maioria dos cristãos seja surpreendida ao descobrir que a bruxaria, freqüentemente, é bem mais sofisticada e complexa do que imaginam. Uma análise cristã sobre o assunto tende a condenar contundentemente a bruxaria. Todavia, tal avaliação deve ser ponderada, justa, para que possamos refletir bem sobre a questão e, antes de qualquer coisa, lançarmos a seguinte pergunta:


"De que tipo de bruxaria estamos tratando?".


Por que se importar?


Alguns crentes podem requerer uma justificativa que explique o porquê da necessidade de se falar em bruxaria. Afinal, é muito difícil, pelo menos em tese, que um evangélico se enverede por um caminho tão excêntrico. A razão para um debate sobre o assunto merece exame precisamente porque a bruxaria está deixando de ser tão excêntrica e se tornando mais popular.


No verão de 2004, o Parlamento das Religiões Mundiais se reuniu em Barcelona, na Espanha. Na ocasião, representantes de muitas religiões do mundo estavam presentes com o intuito de "buscar a paz, a justiça, a sustentabilidade e o comprometimento de trabalhar em função de um mundo melhor". Também almejavam "aprofundar suas espiritualidades e experiências de transformação pessoal". Participaram da conferência (assim como nas de 1993 e 1999) alguns delegados da Sociedade da Deusa, "a maior organização religiosa do mundo voltada para as bruxas do neopaganismo" (qualificativo usado por um ancião da sociedade). Um tema comum debatido nas reuniões foi a ênfase crescente na "interfé", ou seja, nos diálogos sobre vários tipos de fé.


Têm-se notado que o grupo mais freqüentemente omisso em tais conferências é o cristianismo evangélico. O que justificaria tal ausência? Cremos que a cosmovisão religiosa da maioria dos grupos que comparece a tais conferências repudiaria veementemente o exclusivismo religioso que caracteriza o cristianismo histórico e ortodoxo. Muitas religiões do mundo, inclusive a bruxaria, são contrárias ao cristianismo não existindo assim um bruxo (a) cristão, e isso de maneira explícita ou implicitamente. Não obstante, Jesus nos ordenou a pregar o evangelho e a fazer discípulos de todas as nações, e os bruxos não ficam de fora. Mas para que isso seja possível, precisamos entender quem são os bruxos e no quê acreditam.


O que é a bruxaria?


As definições podem facilitar ou impedir a nossa compreensão. A definição útil é aquela que não é demasiadamente simplista e se refere às semelhanças e dessemelhanças que envolvem tanto o termo principal como os adjacentes. Em nossos dias de entusiasmo ecumênico, temos de tomar cuidado e evitar o perigo de fitar com olhos míopes as diferenças entre as várias religiões e a fé cristã que confessamos, porque isso pode custar a nossa alma.


Há semelhanças entre a farinha e a ricina (tóxico extraído da semente da mamona). Ambas são pó branco e oriundas de plantas. Todavia, as suas diferenças são mais interessantes e importantes do que as suas semelhanças. Farinha é comida. A ricina é veneno. Uma promove a vida. A outra causa a morte. Não se deixe enganar pela nossa metáfora, porque não estamos comparando a bruxaria ao veneno da ricina. Apenas estamos tentando mostrar que as diferenças podem ser tão importantes quanto as semelhanças.

Pensando nisso, delinearemos as principais doutrinas da bruxaria moderna a fim de contrastá-las com as principais doutrinas do cristianismo evangélico.

Os muitos nomes da bruxaria:

Quando começamos a investigar o fenômeno da bruxaria moderna, não demoramos a descobrir uma gama de termos associados à sua prática ao longo do tempo: a mágica, a wicca, o paganismo, o neopaganismo, e assim por diante. Alexander Brooks, pesquisador cristão, perito em ocultismo e contracultura, fornece-nos um resumo útil de certas distinções entre wicca, bruxaria e neopaganismo.


O neopaganismo é a categoria mais abrangente de todas, pois abraça um rol extensivo de grupos "que tentam reconstruir os antigos sistemas religiosos não-cristãos - como o escandinavo, o céltico, o grego, o romano e o egípcio - revigorando doutrinas esquecidas, ensinos ocultos e negligenciados ao redor do mundo".


Segundo Brooks, a marca distintiva da wicca (wicca é a categoria mais radical da bruxaria) é o fato de ela exigir de seus adeptos a observância rigorosa de ensinos e práticas específicos contidos na obra do inglês Gerald Brousseau Gardner, que foi quem, provavelmente, nomeou a prática de feitiçaria como wicca.


Pode haver distinções sutis entre wicca e bruxaria, por isso alguns preferem escolher um termo e mantê-lo, a despeito do outro. Mas, na maioria das vezes, as palavras são usadas de maneira intercambiável. A designação "bruxaria", certamente, é a mais familiar entre os praticantes e os não-praticantes, além de ser o termo mais recriminado e rejeitado pelos leigos, que, freqüentemente, atribuem à palavra conotações sinistras, o que justifica a preferência de alguns pelo termo wicca, ao se referirem à prática, e wiccano (a) ao praticante. O prefixo "neo", em neopaganismo, normalmente indica um destaque na prática da pessoa em sua manifestação contemporânea, além de apontar, ao mesmo tempo, uma revivificação e uma conexão com algo antigo.

Bruxaria não é cristianismo


Algumas bruxas acreditam que a prática da feitiçaria é compatível com o cristianismo. Mas, potencialmente, qualquer cristão é capaz de perceber, sem grande dificuldade, que isso é impossível. Poderíamos até mesmo ser censurados por afirmar algo tão óbvio: bruxaria não é cristianismo! Quem confundiria duas coisas tão desiguais?

Contudo, ao sublinhar essa distinção, queremos mostrar duas coisas.


Primeiro, ressaltar o cuidado que devemos ter com vários aspectos sutis da prática da bruxaria, os quais não ferem a cosmovisão cristã, de modo a apresentar incompatibilidade. O que temos em mente aqui é como pode ser fácil para alguns cristãos assumirem que certas práticas que caracterizam o oculto em geral ou a bruxaria em particular são suficientemente neutras, a ponto de um crente fazer uso delas.


Para exemplificar, basta mencionar aqueles cristãos que não vêem qualquer problema em se submeter a sessões de cartas de tarô e não percebem que estão subvertendo a própria visão que possuem acerca da natureza da realidade (isso sem falar no perigo de envolvimento com atividades demoníacas). Mesmo que essas práticas funcionassem, devemos ponderar que o pragmatismo não é critério para a verdade. A Bíblia relata um caso em que aparentemente uma deusa estranha "ouvia" as preces de seus fiéis:


"Mas certamente cumpriremos toda a palavra que saiu da nossa boca, queimando incenso à rainha dos céus, e oferecendo-lhe libações, como nós e nossos pais, nossos reis e nossos príncipes, temos feito, nas cidades de Judá, e nas ruas de Jerusalém; e então tínhamos fartura de pão, e andávamos alegres, e não víamos mal algum. Mas desde que cessamos de queimar incenso à rainha dos céus, e de lhe oferecer libações, tivemos falta de tudo, e fomos consumidos pela espada e pela fome"


O contexto em que esta referência bíblica está inserida mostra bem como a rainha dos céus "auxiliava" seus adoradores, mas como isso era reprovável aos olhos do Senhor: "Porque queimastes incenso [à "rainha dos céus"], e porque pecastes contra o Senhor, e não obedecestes à voz do Senhor, e na sua lei, e nos seus testemunhos não andastes, por isso vos sucedeu este mal, como se vê neste dia"


A nossa segunda justificativa para tratar de uma distinção tão óbvia está relacionada ao fato de que o cristianismo e a bruxaria compartilham (por mais incrível que possa parecer) pontos comuns.


Primeiro: por causa de sua cosmovisão acerca da natureza do mundo, as bruxas têm um forte juízo de preocupação ambiental. Logicamente, as motivações das bruxas e dos cristãos são amplamente distintas. As bruxas possuem consciência ambiental porque crêem que a natureza é sagrada. Os cristãos a encaram como uma questão de mordomia, como algo que Deus nos entregou para zelarmos. Além disso, os cristãos concordam que são responsáveis pela preservação do meio ambiente. Como essa responsabilidade ambiental se traduz em política pública e ações individuais, pode variar conforme a ideologia política e pessoal; não obstante, todos concordamos que existe uma responsabilidade ambiental a ser compartilhada.

Segundo: as bruxas possuem notável consciência em relação aos problemas globais (guerra, fome, doença, etc.). Novamente, a maneira exata como essas preocupações se traduzem em política pública e ações individuais, pode variar conforme a ideologia, mas o nosso campo de interesse é comum e decorre do fato de que somos todos seres humanos e vivemos no mesmo planeta.


Mas apesar desses pontos comuns um praticante de bruxaria não poderia ser cristão já que os dogmas do cristianismo refutam a prática.

Artigo por Richard G. Howe Bacharel em teologia pela Universidade de Mississipi. Mestrado em filosofia pela mesma Universidade e doutorado em filosofia pela Universidade de Arkansas.

Tradução: Elvis Brassaroto Aleixo

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